O Papai Noel e a virada do ano passaram, é chegada à época
de férias.
Lembro-me muito bem quando criança que nesta época batia uma
nostalgia da turminha da escola que ficou pra trás, daqueles momentos vividos
no primário que eram tão interessantes, período da vida em que tudo era
novidade, tudo era aprendizado. Aquela pessoa que nos ensinava o abecedário e
nós chamávamos de tia, seria depois a nossa professora e mais adiante ainda o
nosso mestre.
Vou me sentir um pouco velho em dizer isso, mas, tudo bem;
envelhecer é fazer história e a história deve ser contada. Na minha época de infância
a Turma do Balão Mágico era o grande sucesso na TV e tinha uma canção deles que
se chamava “Amigo e Companheiro”; a letra dessa música em determinado momento narrava
exatamente como eram nossas férias, quando crianças.
Muitas situações em nossas vidas mudam apenas de endereço,
de nome, mas na essência são iguais, e assim eram as brincadeiras de criança,
as férias; mas comigo, teoricamente, seria diferente: afinal eu tinha nascido
com uma deficiência. Hoje falamos de inclusão, acessibilidade, mas na década de
80 tudo isso era muito diferente. Para terem uma ideia, apenas em 2006 a ONU
adotou uma nova lei, a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, a
qual o Brasil só veio a ratificar em 2008. Com isso como acham que eram minhas
férias? As pessoas com deficiência brincam? Passeiam? Viajam?
Bom, não saberei dizer a palavra exata para definir essa
situação que vou colocar pra vocês, mas a que mais talvez se aproxime do que
pretendo definir nesse momento é a palavra sorte. Agora ficou ainda mais
confuso né? Como uma pessoa que nasce com deficiência usa a palavra sorte para
definir algo? É simples, ou nem tanto simples, mas o fato é que em 1976 quando
pouco se falava em deficiência – inclusão, então, nem pensar -, nascer com
deficiência e a família rapidamente absorver o impacto da notícia do recém-nascido
e dar a ele um direcionamento com toda naturalidade e o mais normal possível,
fazendo com que seguisse os mesmos caminhos dos meus outros dois irmãos,
deixando sempre muito claro os direitos, deveres e obrigações que me cabiam,
foi ou não sorte?
Com o apoio de toda família, principalmente minha mãe, eu fazia
tudo o que qualquer criança da minha idade na época fazia, claro com algumas
adequações; afinal eu tinha uma limitação, não andava como as demais crianças.
Mas, graças aos familiares e amigos, este não foi um impeditivo para que eu
tivesse uma infância com brincadeiras, passeios, viagens e muitas lições de
casa que as tias passavam nas férias.
Eu adorava soltar pipa; para acompanhar meus amigos, minha
mãe colocava uma cadeira na calçada e me segurava em seu colo para que eu
pudesse soltar a minha pipa; sentado no chão, eu jogava bolinhas de gude com a ‘turma
da rua’, na verdade meus vizinhos. Sempre brincávamos juntos e formávamos então
a Turma da Rua Manaus. Faço questão de destacar o Vinícius que era meu vizinho
de muro, sem dúvida meu grande amigo e companheiro de infância. Adorávamos
também rodar pião, bater bafo, mas o que mais eu gostava de fazer era de jogar
futebol, futebol sempre foi minha paixão esportiva, a minha brincadeira
predileta. Na época eu não usava ainda cadeira de rodas; minha primeira cadeira
de rodas eu ganhei quando tinha 11 anos. Até então eu usava um triciclo, chamado
de ‘tonquinha’ na época, e com essa ‘tonquinha’ eu fui um grande centroavante,
fui Serginho Chulapa, fui o Careca, fiz mais de 1000 gols e muitos de bicicleta;
afinal algumas bolas cruzadas pelos Vinícius passaram pelo meu pé e, ao bater
no pedal, entrava no gol. Gol de bicicleta certo?
Bem, meus amigos leitores, é isso ai. Com deficiência ou não,
férias são férias, vamos às brincadeiras, aos passeios e tudo mais que todos
temos direitos. Com muito amor, criatividade e força de vontade tudo é possível.
O ambiente em que vivemos deve ser adaptado para que possamos usufruir o melhor
possível dele, ter deficiência não é sinônimo de doença, nem de reclusão e
muito menos de abdicação das férias. Obrigado aos Vinícius, aos familiares e
que todas as pessoas com deficiência tenham essa mesma sorte que eu tive e possam
ter suas férias respeitadas. BOAS FÉRIAS.
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